O projecto que deu origem ao laboratório Cremedoce de Fronteira nasceu em 2017. A ideia era criar uma empresa social com um triplo valor: permitir que os jovens moçambicanos aprendessem um novo trabalho, fornecer um produto nutritivo às crianças de Ressano Garcia, cidade na fronteria com a África do Sul, a um preço social e, dada a elevada rentabilidade, permitir a criação de um fundo para bolsas de estudo universitárias para os jovens que desejam estudar. O projecto ganhou vida oficialmente em 2018, quando a responsável pelo Centro das Irmãs Scalabrinianas de Ressano Garcia, Irmã Carla, juntamente com Damião, um funcionário do Centro, e José Maria, um dos jovens beneficiários, vieram para a Itália, graças aos parceiros do projeto, para aprender a fazer gelado e como funcionavam as máquinas.

Em 2019, com a abertura do laboratório e do ponto de venda em Ressano Garcia, juntaram-se a eles Carlitos, Castigo, Chadrek, José e Dalva, que receberam formação com Gino Fabbri, pasteleiro de renome mundial, e com um formador da Fabbri1905. Durante todo o primeiro ano de actividade, eles ganharam experiência, produziram gelados, picolés e sorvetes, e o ano terminou com a participação na feira de produtos italianos em Maputo.

Chadrek nos conta sobre aqueles meses: «O processo de formação não foi difícil, porque o professor era paciente e reconhecia o nosso empenho. O que mais me surpreendeu foi precisamente o gelado: era muito diferente do que eu conhecia! Trabalhar na gelataria de Ressano Garcia foi uma experiência agradável, apesar de o ambiente ser exigente. As pessoas gostavam do produto! A minha vida mudou depois de começar a trabalhar neste projecto. Sou natural da Beira, onde estudei até ao sexto ano, depois desisti. Mas, trabalhando na gelataria, retomei os estudos até ao 12º ano e concluí-os. Agora continuo a aprender outras coisas. Sinto que cresci como pessoa graças a este projeto. Aprendi muito mais do que esperava e nunca imaginei chegar onde estou hoje. A minha família, a minha comunidade e o meu antigo empregador reagiram positivamente quando souberam do projecto. Ficaram surpreendidos e gratos.”

Infelizmente, o que deveria ser o ano do grande salto acabou por ser um revés: com a COVID, tudo parou e perdeu-se o impulso que tinha começado nos meses anteriores. Entre várias tentativas de recomeçar, percebemos que precisávamos de alguém competente e apaixonado que pudesse assumir a gestão do projecto e dar-lhe aquele impulso extra e, finalmente, em 2023, conhecemos Alberto, um gelatiere italiano que trabalhava na cooperação, mas pronto para deixar tudo para se dedicar à sua paixão: o gelato!

Em outubro, ele abriu a Gelarte bem no centro de Maputo, na FEIMA, e o seu gelado é o mais apreciado tanto pelos moçambicanos como pelos estrangeiros! «Eu trabalhava na Cooperação Internacional, estou em Moçambique há cerca de um ano e meio. Eu estava cansado da cooperação e então alguém me falou do projecto das Irmãs Scalabrinianas em Ressano Garcia, que inicialmente eu não conhecia. Procurei informações online e descobri o projeto… pensei: “impossível que funcione!”

Alberto fez dois cursos de gelataria na Itália, um básico e outro avançado, e sempre gostou de criar, desde os sabores mais clássicos até os mais exóticos e experimentais, como o gelado de wasabi para os jantares japoneses. Fazer gelados requer uma fórmula precisa, conhecimento dos ingredientes e muita precisão: não é nada fácil. «O Chadrek foi uma grande mais-valia: ele já conhecia as máquinas e ensinou-me muito. Ele não cria a fórmula do gelado porque é mais complexa, mas conhece muito bem a produção prática. Hoje, só o Chadrek trabalha comigo, mas tem sido gratificante manter o espírito social do projecto. Recebemos escolas, mostramos como se faz gelado e pizza e também temos uma horta didática. Gostaria de colaborar ainda mais com a AGAPE e com outras organizações e quero manter este aspeto social na gelataria. »

A FEIMA é o local perfeito para continuar a produção e a venda, mas também para expandir as atividades: «O espaço é bonito, verde, bem localizado, de fácil acesso e com as características certas para uma actividade deste tipo. A gelataria também oferece espaços para festas de aniversário, eventos e venda por grosso para restaurantes e empresas. Gostaria também de realizar cursos de teatro ou música, mas é necessário um plano económico bem estruturado.»

Portanto, podemos afirmar que o projecto Cremedoce de Fronteira chegou ao fim, mas que uma nova e duradoura colaboração com a Gelarte teve início, com o objectivo de alcançar outras metas mais ambiciosas para as crianças e jovens moçambicanos.

“Este projecto teve uma grande influência nos meus sonhos e objectivos. Ainda tenho o sonho de entrar na universidade e estudar Engenharia Mecânica. O meu conselho para outros jovens que têm a oportunidade de participar em projetos como este é: aproveitem a oportunidade! Aprendam o máximo possível. Tenham concentração, foco, disciplina e ouçam o professor. O projecto trouxe muitos benefícios aos jovens de Ressano Garcia. Espero que iniciativas como esta continuem, porque fazem uma grande diferença. Gostaria de agradecer a todas as pessoas que criaram, apoiaram e investiram neste projeto. Continuem a ser extraordinários.» Chadrek